Quais as implicações psicológicas da globalização na vida das pessoas? Este questionamento balizou a discussão ocorrida na tarde desta quinta-feira (20), na mesa intitulada “Psicologia, Ciência e Globalização”, durante o IV Congresso Brasileiro de Psicologia (CBP), em São Paulo.
Na atividade, a pesquisadora Maria Cristina Ferreira abordou aspectos da discussão sobre a globalização no contexto da Psicologia, partindo da diferenciação entre características positivas e negativas do fenômeno. Para ela, a mobilidade proporcionada pela ausência de barreiras e a possibilidade de ampliação das identidades culturais, de um lado, se conflitam com aumento da distância socioeconômica entre pobres e ricos, de guerras, de sofrimento humano e da xenofobia, de outro. “É um fenômeno que tem mudado o foco da identidade. Fala-se em bi-identidade, abarcando o local e o global. Já em relação à saúde mental, por exemplo, há efeitos mais prejudiciais do que benéficos, principalmente no contexto do trabalho. O aumento de tarefas no mundo do trabalho implicam o aumento do stress”, afirmou.
Ferreira apontou, ainda, a emergência da Psicologia da Globalização um campo novo e promissor de estudos para a Psicologia. “Como a Psicologia pode ajudar a enfrentar os problemas ocorridos em função da globalização, com foco no indivíduo, na cultura e no contexto global? A meu ver, este é um novo desafio, uma área que está para ser desenvolvida e que pode ser incluída em agendas e programas futuros de pesquisa”, completou.
A psicóloga Ana Bock direcionou a reflexão para a discussão da Psicologia enquanto ciência globalizada. “Haveria Psicologia que se referisse a todos os humanos como iguais, sem levar em consideração a influência do meio sobre os sujeitos? A Psicologia deve ser capaz de estimular a produção específica”, apontou. Para ela, questionar a utilização de padrões universais para lidar com todos os sujeitos do planeta é fundamental, bem como conectar o tema a questões políticas e epistemológicas. “Assistimos à colonização do pensamento científico: temos poucas referências locais, rejeitamos ou incorporamos automaticamente conhecimento externo, chegando ao absurdo de achar que é a realidade que não se adapta ao que eu sei. Não deixamos a realidade fazer perguntas ao conhecimento”, concluiu.
De qual globalização estamos falando?
Na avaliação de Rogério Oliveira, vice-presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), o tema da globalização, por estar em curso, torna difícil sua compreensão. “Ainda não chegamos a um momento em que há um ponto de virada. Mas conseguimos, contudo, enxergar as consequências desse processo”. Oliveira abordou a relação entre a ocupação de territórios por potências hegemônicas com a finalidade de exploração da riqueza que eles abrigam, característica do processo de globalização atual.
Ele citou, ainda, o deslocamento das populações negras para o continente americano – fator preponderante da acumulação de riqueza que possibilitou a globalização. “Vamos chegar a um momento em que, não havendo condições de exploração da natureza, a última fronteira é exploração da própria humanidade para a geração de riqueza”.
Para Oliveira, a definição sobre o tipo de globalização à qual nos referimos deve conduzir à reflexão sobre qual sociedade queremos construir. “Penso que não estamos mais dispostos a corroborar com uma sociedade em que uma minoria tem uma condição de vida excelente e uma maioria tem uma condição precária. A Psicologia não está apartada desse processo de globalização e de novas proposições para a sociedade. Queremos manter como positiva a falsa variável da ‘boa globalização’? A sociedade globalizada enxerga negativamente a Psicologia contra-hegemônica, que vai na contramão desta perspectiva. Como nos organizamos para apresentar proposta de formação brasileira? Nossa construção histórica é valiosa, não podemos ignorá-la”, concluiu.
O IV CBP teve início nesta quarta (19), na Uninove, em São Paulo, e termina no próximo domingo (23). Conheça a programação do CFP na atividade aqui.